Efeito casamento Por Raffaella Silvestri
Na transição de bruxa feminista à mulher casada, me tornei muito mais atraente para os homens héteros. Após o casamento: uma fase excitante e estranhamente pacífica de uma nova liberdade (e de um desejo mimético).
Um tempo atrás, fiz aulas de direção defensiva de scooter. Saí na estação de metrô San Donato, onde tinha um encontro marcado, com o único instrutor disponível, no fim de julho, em um estacionamento na periferia de Milão, no auge do verão. Ele estava lá me esperando, apoiado em uma scooterzinha, com o quadril projetado para a frente e o braço relaxado sobre o capacete. Percebi como ele me olhava, e aquele olhar ficou grudado em mim junto da lufada de vento opaco, a ansiedade de dirigir e a base de maquiagem leve. Normalmente, não reparo nessas coisas. Desde jovem, minhas amigas diziam: você nunca percebe nada, olha aquele ali, mas não vira agora. Era verdade, eu não percebia nada, tinha um escudo que me protegia dos homens, eles me intimidavam – prepotentes, violentos, incômodos, penetrantes. Me fazia invisível, e eles eram invisíveis para mim. Com o tempo, minha relação com os homens mudou, mas o olhar do instrutor de direção naquele fim de julho foi um olhar de um novo tipo, que marcou o início dessa minha nova fase. Aliás, o olhar dele fez com que eu também o enxergasse – um homem atraente, calmo, sério. Atributos que, no passado, eu não teria notado: teria sido apenas um homem.
E percebi logo essa mudança. A primeira pessoa a quem contei foi para outra mulher, como muitas vezes acontece, em uma série de mensagens. Comecei de forma indireta: desde que me casei, disse, parece que me reconciliei com os homens héteros. Ou melhor, que eles se reconciliaram comigo. De repente, eu amansei os homens: eles se aproximam, falam comigo, se abrem. «Eles dão em cima de você», ela sintetizou corretamente.
Minha transição foi talvez um pouco brusca: de um relacionamento à distância para o casamento; de bruxa feminista a mulher casada (e, portanto, parte do sistema?), de praticamente solteira (cadê seu namorado? Se não vejo, não acredito) à mulher protegida pela aura do sagrado vínculo. E, por isso, desejável. Nada de magnetismo. Nada de glow. Casem-se, e vocês terão um radar atrativo com um raio de quilômetros.
Aos poucos, fui confirmando essa nova tendência dos homens de suavizar hostilidades ou atritos, de falar comigo de forma mais honesta, de pedir confirmação até o ponto de tentarem me seduzir. Por um tempo, fui tentada a acreditar que isso não tinha nada a ver comigo, apenas com eles. A responsabilidade é do mundo, são eles. Mas claro que tem a ver comigo também, com meus medos e meus desejos profundos, com meus traços não resolvidos e com a abertura dos inícios.
É uma fase excitante, para mim que passei tanto tempo em guerra, quero racionalizá-la para não me inebriar dela. Sei que, como todas as transições, vai durar pouco, então quero explorá-la; justamente porque sempre tive um pouco de medo dos homens, quero deixar que me olhem com essa nova disposição, esse desejo relaxado. Quero aproveitar essa paz, que está longe de ser uma paz dos sentidos: sob essa trégua, movem-se desejos, espelhos, triângulos e outras geometrias. Com o instrutor de direção, tomei um café: ele me explicou sobre motores, artes marciais, sua visão de mundo, e eu não fiquei incomodada. Pelo contrário, recomendei que ele lesse Nova, de Fabio Bacà, um livro que, em outros tempos, teria me irritado com seu narrador (tão) hétero e sua jornada para redescobrir a violência da luta corporal, soterrada por mil camadas de cultura e educação. Mas agora, eu gostei, me divertiu e me interessou.
Me veio à mente outra fase. Eu tinha vinte anos, e os homens ao meu redor me pareciam prepotentes, arrogantes – «pediam» o sexo como se tivessem o direito de «obter» – e uma psicóloga cognitivo-comportamental me deu um exercício: conversar com homens de 18 a 90 anos, aproveitar cada oportunidade para bater papo, sem intenções românticas, apenas conversar. Foi um excelente exercício para meu crescimento, e marcou uma fase, aquela entre os 20 e 30. Nesse período, qualquer ideia feminista, qualquer rebelião contra a homencracia, contra o pensamento patriarcal, era compensada por um desejo de ser apreciada, cortejada, escolhida. Essas duas forças coexistiam dentro de mim, e o resultado deveria parecer aceitável do lado de fora. Depois dos trinta, surgiu uma outra dinâmica. O que você quer, quem você é? De quem você é? A mulher sozinha e sem filhos assusta: ela pode querer te prender – desejar uma família – pode ser perversa, e tendo experiência, além de inteligência, pode ser uma bruxa.
Nessa fase vivi por muitos anos, como se precisasse me desculpar com os homens por ser independente, adulta e, portanto, cheia de opiniões, e ainda assim ter a audácia de não ser lésbica. Eu era simplesmente inaceitável. Toda conversa era contaminada por uma fricção, uma hostilidade, que, como em toda Guerra Fria, se intensifica por ambas as partes – nesse processo de agravamento que a torna tão assustadora e desgastante. Eu estava muito irritada e, nesse sentimento, sozinha. A maioria das mulheres era «de alguém» ou, de qualquer forma, menos arisca. A maioria dos homens não faz ideia do que estou falando.
Aos trinta e sete anos, quando me casei, tudo mudou de novo, de um dia para o outro e radicalmente – eu não precisava mais equilibrar as coisas. São os homens que se aproximam de mim em paz e conversam comigo. Por quê?
No livro Mentira romântica e verdade romanesca, o crítico literário e antropólogo René Girard introduz sua «teoria do desejo mimético». Para Girard, o sujeito deseja um objeto não por suas qualidades intrínsecas, ou seja, não pelo objeto em si, mas porque imita o desejo de um terceiro, que Girard chama de modelo, a quem o sujeito gostaria de se parecer. Na prática, a presença de um Outro é necessária para o desejo, e o desejo é sempre desejo de imitar e, por fim, ser como outra pessoa. Não por acaso, Girard, que publicou esse texto em 1961, foi chamado de «padrinho dos likes»: é uma dinâmica que conhecemos através da publicidade e, mais recentemente, pelo fenômeno dos influenciadores.
Em resumo: «Fulano casou com você, logo te quis, então eu também te quero.» Deste desejo mimético resulta também toda rivalidade humana: enquanto o modelo é inalcançável o equilíbrio se mantém, caso contrário sujeito e modelo acabam por rivalizar, competir e enfim obter as mesmas coisas, em suma se tornam semelhantes demais. Nesse contexto a mulher é objetificada (a trophy wife, a milf), carregando o valor do desejo alheio. E pode até desaparecer por completo, como acontece em O eterno marido e em outras obras de Dostoiévski (incluindo O duplo): restam apenas sujeito e modelo, atraídos um pelo outro em relações recíprocas e ambíguas.
Trazendo o discurso para o meu cotidiano, no entanto, não me sinto completamente objeto dessas novas dinâmicas; preciso reconhecer uma liberdade e uma responsabilidade de agir. Ou seja, de alguma forma sutil, eu mudei – uma mudança que deve ter florescido logo abaixo do comportamento, naquilo que podemos chamar de atitude. Pois bem, quando converso com um homem depois de casada, não preciso mais me preocupar em deixá-lo à vontade, ou seja, em fazê-lo entender que não quero nada dele. Agora percebo que era um fardo que eu sempre assumia, mas talvez eles também sentissem isso; nesse atrito tinha uma espécie de ansiedade de desempenho de ambas as partes. Ou seja: estamos aqui, somos adultos, e enquanto ninguém é casado, o jogo não está realmente encerrado. Mas, com o jogo já definido, dentro das regras, há mais espaço para a liberdade, mais coisas podem acontecer. Só sabemos ser maleáveis dentro de limites estabelecidos, enquanto num campo muito aberto, endurecemos.
Todos nós levamos dentro de nós e muitas vezes operamos a partir de uma carga erótica. Isso não tem a ver com o desejo racional de agradar ou de ser amado, mas com o nosso desejo de sentir prazer e de nos manifestarmos no mundo como seres sexuados. Os lugares também têm seu chakra metafórico: Milão é uma cidade assexuada, ainda que se faça muito sexo (ou talvez só se deslize muito o dedo no Tinder, vai saber), enquanto Roma é uma cidade sensual, onde os homens me dirigiam a palavra um pouco mais, mesmo quando eu ainda não usava uma aliança no dedo.
Mostrar esse erotismo intrínseco torna alguém atraente, mas também vulnerável. A «regra» imposta pelo estado civil protege justamente dessa vulnerabilidade, permitindo trocas com mais nuances (o erotismo pode se manifestar sem que o outro se sinta, por isso, no direito de obter um encontro sexual). Além disso, as regras pressupõem a possibilidade de serem quebradas (ou seja, sempre há a chance de que a esposa de alguém perca a cabeça justamente por mim): é uma possibilidade suficientemente remota para tornar as interações mais seguras, relativamente protegidas de gafes ou expectativas, mas ainda assim interessantes.
Naturalmente, os homens com quem converso não querem realmente que eu deixe meu marido por eles (ainda que, em alguns casos, possam acabar acreditando que sim, querem), mas um conjunto de fatores está me tornando, pela primeira vez na vida, verdadeiramente atraente. Além de me deleitar com essa mudança de sorte, foi interessante olhar para dentro de mim e admitir que minha atitude mais aberta facilitou uma troca humana que escapa dos papéis opositivos entre os gêneros. Em outras palavras, mudei de um jeito que faz com que meus interlocutores se sintam mais acolhidos, escutados – porque, de fato, me sinto mais livre para ouvi-los. E sou mais livre porque, por minha vez, estou protegida de certas ameaças de agressividade. Essa instituição me deu um pouco da proteção que promete à mulher (uma proteção ilusória dentro de uma troca desvantajosa, segundo Simone de Beauvoir), mas de uma forma inesperada e mais interessante do que eu imaginava.
Raffaella Silvestri (Milão, 1984) é escritora. Estudou Filosofia de Gênero em Helsinque e Filosofia das Ciências Sociais em Cambridge. Escreveu os romances La distanza da Helsinki (Bompiani, 2014) e La fragilità delle certezze (Garzanti, 2017). Mantém a newsletter «Velluto».